sexta-feira, 7 de agosto de 2009

Reserva de Propriedade

Um dos contratos em que o direito de propriedade desempenha uma função de garantia é o da venda com reserva de propriedade. Entre nós a transferência da propriedade ocorre sempre em virtude da celebração do contrato, e normalmente, no momento dessa celebração. Sendo assim, a transmissão dos bens é extremamente facilitada em prejuízo dos interesses do alienante. Ora, se for celebrado um contrato de compra e venda de um bem, o comprador torna-se imediatamente proprietário do bem vendido e pode voltar a aliená-lo, mesmo que este não lhe tenha sido entregue ou o preço respectivo ainda não esteja pago. A compra e venda são deste modo um negócio arriscado para o vendedor, que passa de proprietário de um bem, a um mero detentor de um direito de crédito, sem qualquer garantia especial. Para além disso, a nossa lei civil prevê que o vendedor não tem direito de resolução do contrato por incumprimento da outra parte a partir do momento em que ocorra a transmissão da propriedade e a entrega da coisa. Para protecção do vendedor, tornou-se comum nos contratos de compra e venda a crédito, a celebração de uma cláusula de reserva de propriedade, pela qual o alienante reserva para si a propriedade da coisa, até ao cumprimento total ou parcial das obrigações da outra parte. Contudo, se a venda já foi realizada, não poderá posteriormente ser nela inserida uma cláusula de reserva de propriedade, dado que a propriedade já foi transferida para o comprador. Esta cláusula pode ser celebrada em relação a quaisquer bens imóveis ou móveis. A função desta cláusula não é permitir ao vendedor a continuação do gozo sobre o bem – uma vez que este é entregue ao comprador precisamente para o fim de lhe atribuir o seu gozo – mas apenas para defender o vendedor das eventuais consequências do incumprimento do comprador. Assim, são 3 as suas funções. A saber: de resolução do contrato, de garantia e de direito a ser indemnizado.
Em caso de incumprimento do comprador pode o vendedor resolver o contrato, uma vez que a exclusão deste direito, face já ao explanado, só se verifica se tiver ocorrido a transmissão da propriedade da coisa. Ressalva-se que no caso de compra e venda a prestações, exclui-se a resolução do contrato se o comprador faltar ao pagamento de uma prestação e esta não exceda a oitava parte do preço, contudo, se o comprador faltar ao pagamento de duas prestações, mesmo que estas em conjunto não excedam a oitava parte do preço, já há lugar a resolução do contrato. A razão de ser do regime jurídico da cláusula de reserva de propriedade é tutelar o crédito, na medida em que, seria difícil aos compradores comprarem sem crédito, deste modo, os vendedores atribuem este crédito comercial aos compradores. É assegurada com a reserva de propriedade a restituição da coisa no caso de incumprimento da outra parte. Em suma, o vendedor tem uma posição mais sólida do que aquela que teria se não houvesse cláusula de reserva de propriedade. Este regime traduz-se na protecção do vendedor, pois vai sempre permitir-lhe obter a restituição da coisa, mesmo no domínio da declaração de insolvência do comprador. No caso de incumprimento do comprador o alienante pode resolver o contrato, uma vez que a resolução vem acompanhada da restituição da coisa. A indemnização será a pequena indemnização, juridicamente chamada indemnização pelo interesse contratual negativo, ou seja, o crédito indemnizatório do vendedor vai ser menor, devendo reter-se que neste caso o vendedor terá também que restituir as prestações que recebeu. Se não houvesse reserva de propriedade, no caso de incumprimento do comprador, como o vendedor não tem direito de resolução a indemnização será pelo interesse contratual positivo – como o leitor já depreenderá – a grande indemnização. Fica uma noção jurídica e simples da cada vez mais utilizada cláusula de reserva de propriedade.

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